quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A África Escrava

Ana Carolina Robaina
Gabriela Bassan Piedade
Gislaine Dedemo
Henrique Franco da Rocha

Paul Lovejoy discorre acerca do processo de escravização desenvolvido no continente africano antes mesmo do século XVI. A escravidão era tida já como uma instituição legalizada por leis e pelos costumes. Os escravos eram utilizados como mercadorias de exportação, assim como também como trabalhadores cativos dentro do próprio território africano. O islamismo apresentou uma forte influência sobre o continente da África, não só por representar-se como um forte mercado externo de escravos, mas também por fazer com que seus princípios religiosos fossem assimilados, principalmente os referentes à escravidão.
O autor apresenta algumas hipóteses acerca da quantidade de escravos que foram comercializados em determinados períodos de tempo e espaço, dados que ele não confirma por falta de documentação adequada, no entanto, Lovejoy usa esses cálculos no seu próprio trabalho, mas esclarece que o mais importante é salientar que havia uma demanda por escravos no mundo islâmico e esta era regular, e isso possibilitava um contato permanente entre as sociedades muçulmanas e as sociedades subsaarianas. Mesmo que os números incertos venham com o aviso do autor sobre eles, não parece razoável trazer dados que não são certos para confirmar suposições.
O texto traz algumas considerações acerca do processo de escravidão africana que deixou claro como se dava a escravidão nesse continente. Os governos africanos conseguiram manterem-se autônomos politicamente e culturalmente, pois a influência islâmica deu-se de forma gradual e não como produto de uma dominação imediata e intensa. Os fatores externos contribuíram para consolidar e intensificar o comércio de escravos, contudo, os fatores internos foram muito mais importantes e decisivos, pois a obtenção de escravos estava diretamente relacionada às guerras políticas travadas internamente por opositores políticos locais. Entretanto, a exportação e as receitas podem ter estimulado a escravização, porém, não seriam estes os desencadeadores do processo em si.
Os escravos eram frutos de guerras internas, assim como também de razias, ou seja, invasões aos territórios vizinhos. A captura de escravos dependia de vários fatores como: esgotamento da população, fugas destas, fortificação de cidades, fatores geográficos e climáticos. Lovejoy traz relatos que comprovam que aqueles que se baseavam nos princípios islâmicos acerca da escravidão acreditavam que os povos formados por muçulmanos livres não deveriam ser escravizados, enquanto que escravizados deveriam ser somente os pagãos descrentes e os que não haviam sido executados quando capturados.
A internalização de atitudes muçulmanas relacionadas à escravidão foram assimiladas por comerciantes e governantes africanos que passaram a utilizar os escravos da mesma forma que o eram no mundo islâmico. Desta forma, transformaram-os em administradores, concubinas, soldados, empregados domésticos e trabalhadores agrícolas. Esta última função foi mais tipicamente utilizada na África subsaariana quando comparado às regiões muçulmanas antes de 1600. Esses escravos produziam para seus senhores e não tinham oportunidade de prosperarem economicamente e nem socialmente.  Quanto ao tipo de plantation empregada nessas comunidades compostas por trabalhadores escravos não há um consenso dentro da historiografia. Alguns pesquisadores acreditam que eram da mesma natureza das plantations americanas enquanto que outros acham que eram mais parecidas com a agricultura do tipo feudal. Os escravos também eram usados para a extração do ouro e do sal.
Na África muçulmana durante a Idade Média os escravos não eram uma classe muito bem definida e estes podiam até mesmo obter uma posição satisfatória em termos tanto social quanto material. Contudo, o trabalho escravo era de substancial importância para o desenvolvimento da economia. Os ataques para a captura de escravos era uma preocupação constante. Muitos escravos eram escravizados durante esses ataques, mas boa parte era executada ou morta durante o processo de aprisionamento. Famílias e comunidades inteiras eram destruídas. A fome e a miséria eram condições as quais as vítimas estavam sujeitas. A preferência era pelas mulheres, pelas crianças e pelos eunucos, sendo assim, os muitos velhos, muitos jovens e até mesmo os homens adultos eram executados. Enfim, a ameaça dos ataques, da escravização e até mesmo da morte faziam com que muitas pessoas se submetessem ao Estado, portanto, aceitavam pagar impostos regularmente para que não sofressem a violência do processo e da própria escravidão.
Lovejoy expõe dados acerca das origens do comércio de escravos realizado por portugueses a partir do Atlântico. Esses portugueses utilizaram os escravos da mesma forma que os muçulmanos já os utilizavam, dispondo pra serviços domésticos, produção agrícola e, até mesmo, faziam comércio de uma região a outra. Os portugueses desejavam obter escravos e ouro, mas também estavam dispostos a comercializar outros produtos, como pimenta e marfim. O autor fez uma boa analise da situação do português na África e retirou dele toda a responsabilidade pela escravidão, deixando claro que os portugueses ampliaram o comércio e não modificaram em nada a relação da escravidão e sua conduta.
Por fim, o autor explica que o processo de escravidão foi sofrendo transformações com o passar dos anos. E que a participação dos portugueses contribuiu também para que a escravidão passasse de sua forma mais primitiva, ou seja, quando esta estava relacionada à conflitos travados entre grupos familiares para uma atividade institucionalizada. O processo passa então a ser regido por uma relação de mercado e demanda, e desta forma o “produto” da escravização transforma-se também em um produto de exportação comercializado pelo continente Africano.


LOVEJOY, P. Nas fronteiras do Islã. IN: _______. A escravidão na África: uma história de suas transformações. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 59-85. 

10 comentários:

  1. O post é pratico, simples, e esclarecedor. E mostra uma boa influência do islãmismo, não priorizando o aspecto religioso, sim que os islãmicos contribuíram em um dos baluartes econômicos dos distintos "reinos", "estados medievais", subsaarianos. E claro é a aliança entre lusos e subsaarianos expostas, sem o mito do português provocador da escravidão africana.
    E C. Boxer, em "O Império Ultramarino Português", aborda que os portugueses empregavam nos usos dométicos elevado número de escravos vindos da África,nos domínios lusos do Oriente (Índia, principalmente).

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  2. Lovejoy trabalha ao longo de seu texto a tese de que a escravidão na África já possuía grande importância social, econômica e política mesmo antes do século XVI. Esse mercado era alimentado por invasões a outras regiões, onde os perdedores eram escravizados. Com a influência muçulmana, este mercado ganhou proporções ainda maiores e novas regras, baseadas na justificativa religiosa, onde muçulmanos não poderiam ser escravizados. Muitos escravos eram utilizados em empregos domésticos, administrativos e até em situações agrícolas, como ocorreu no Vale do Níger, que alguns autores comparam com as plantations brasileiras.Isso gerou uma certa diferença entre os tipos de escravidão, pois na região onde se encontra agricultura, pode-se dizer que ocorre uma situação de escravismo. Também é evidente que com a chegada dos portugueses, que conseguiram se adaptar à um mercado já existente, a proporção da escravização na África aumentou de maneira significante.

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  3. É necessário dizer que um texto com tantas informações como o do Lovejoy torna uma tarefa difícil conseguir sintetizá-lo em poucas palavras, porem o grupo conseguiu pegar as principais idéias muito bem. Tratando do texto em si, o autor analisa o desenvolvimento da escravidão no continente africano e suas transformações após o contato com o mundo muçulmano e posteriormente europeu. Mas o que é muito interessante mostrar, é que Lovejoy bate de frente com aquelas idéias de que: a escravidão nao existia na África, não se tinha um comércio organizado de escravos dentro do continente, entre outras.
    Lovejoy traz nesse texto várias informações que nos faz repensar a questão da escravidão e seu comércio de exportação como: a mulher era o escravo mais exportado, seguido pelos eunucos; uma diferenciação quanto ao tipo de escravo da África subsaariana quanto ao restante, ...

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  4. É importante notar nesse texto do Lovejoy que o processo de comércio de escravos houve de maneira regular para o mundo islâmico, sendo que não necessariamente, o autor trata com números exatos a quantidade de escravos que participaram desse transe. No entanto, é válido lembrar que o autor destaca a escravidão na África antes mesmo da chegada do europeu em seus portos. Além disso, o texto do Lovejoy segue com muitas informações sendo necessária uma ampla análise, podendo até, em certas ocasiões, gerar algumas curiosidades sobre o tema, que até então poderiam ser, anteriormente, desconhecidas...

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  5. Lovejoy retrata com maestria e brilhantismo a questão da escravidão e do escravismo no continente africano. Diferente do que se pensa "que os europeus escravizaram a África", Lovejoy discorre sobre a escravidão enquanto uma instituição tradicional da cultura africana anterior ao século XVI. A expansão do islamismo é outro ponto que recebe um destaque por parte do autor, pois a patir dele pôde-se perceber uma espécie de unidade entre aqueles que professavam a mesma fé, sem contar que os muçulmanos estavam "livres" da escravidão somente por serem muçulmanos. Além dos fatos suprecitados, Lovejoy também relata a diferença do trabalho dos escravos. Diferença esta que pode ser dada por diversos fatores, como a geografia local e a necessidade de cada senhor.
    Francisco Barros

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  6. Importante notar que o texto “A escravidão na África” de Lovejoy, relata, em suma, a escravidão e o mercado escravo em desenvolvimento na África, presentes antes mesmo da chegada dos europeus. Era possível verificar internamente entre os próprios estados africanos, sendo provavelmente a principal fonte de receita, porém não dependentes dessa atividade. No mercado externo, entre 1400 e 1600, teve forte influência do Oriente Médio e, portanto, do islâmismo. Existiam seis rotas principais que atravessavam o deserto, em virtude do comércio.

    Dessa forma, o autor deixa claro sobre o existente processo de escravidão e comercialização antes mesmo da chegada dos portugueses no continente Africano. Isso mostra ser um equívoco pensar os portugueses como pioneiros no comércio de escravos africanos, mas sim como intensificadores e modificadores de um mercado já consolidado. Melhor definir os portugueses: “ envolvidos no comércio de escravos africanos como meros atravessadores “…
    Dario Polacchini Neto

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  7. A parte mais importante do texto, para mim, é com certeza onde é mostrado que a escravidão era confirmada e propagada dentro da própria África através do islamismo. A religião mais uma vez aparecendo como prova irrefutável do direito de se subjugar e, no caso, escravizar os povos pagãos, no caso os não islâmicos.

    Outro ponto interessante e bastante esclarecedor é o fato do português ter perdido o papel de vilão da escravidão para o muçulmano que já residia na África e invadia as terras dos inúmeros povos do continente. O português, portanto, serviu meramente como um catalisador da escravidão do negro africano, visto que foi responsável apenas pela ampliação do comércio do mesmo. É comum vermos, nós todos, o negro africano escravo como a vítima do branco português, este sendo pintado como o demônio, ideia que Lovejoy (que nome mais sugestivo o desse autor, aliás [risos]) desconstrói e nos apresenta que o negro levado para o Brasil já era escravo e, pelo andar da carruagem, continuaria sendo escravo em seu próprio continente, sob a o argumento de ser pagão e não seguir os preceitos do islã.

    Devo ressaltar também que achei o texto bastante direto, objetivo e informativo, dou os parabéns ao grupo por conseguir sincronizar todas as ideias que o texto procura passar.

    João Paulo Bonome Neto

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  8. A questão islâmica, muito bem abordada aqui, é vista de uma óptica diferente, já que o aspecto religioso é deixado em um segundo plano para que fosse exibida as referências econômicas. Fora isso, fica claro a importância atribuída à mesma questão no que concerne à influência realizada no continente africano, pois com o advento do islamismo houve uma catalisação desse processo. As questões religiosas e econômicas se misturando aparentemente deixam as questões mais vivas, pois de outra forma a apatia, tão vista cotidianamente, prevaleceria. Acredito que devido a isso, a minha atenção tenha se voltado para essas questões que foram discutidas acima.

    Josemar da Silva Pereira - 4º HN

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  9. (Postado por Francisco de Assis Sabadini - Diurno)

    Quero insistir mais uma vez no ponto da existência de um mercado escravista antes da chegada dos portugueses. Embora fosse pequeno, o autor sustenta que já existia um mercado externo controlado pelo islã que foi determinante para a configuração do modelo escravista da África, assim como os portugueses viriam a modificar ainda mais a partir de sua entrada nesse sistema. Se por um lado os portugueses contribuíram para a expansão do mercado de escravos, fazendo do discurso religioso a justificativa para o seu avanço rumo às regiões mais interiores da África - segundo Marina de Mello e Souza , o islamismo serviu, antes destes, como justificativa legítima para a escravidão e até como forma para conseguir mais cativos através as escravização do “infiel”.
    Isso não exclui o fato de que a entrada da Europa no “mercado” não foi fator de modificação do mesmo. Durante os séculos XVI, XVII, XVIII e XIX a escravidão moderna já era algo muito diferente do que acontecia inicialmente em âmbito interno do continente africano. Se o islã encontrou uma forma de justificar a escravidão, os portugueses tornaram essa instituição algo rentável.

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