segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Sem Título


Tatiana Milanello
Olinda Scalabrin
Samuel Santana


De acordo com o texto “Povos em Contato – comércio, poder e identidade” de Marina de Mello e Souza, correspondente ao capítulo III da obra Reis Negros no Brasil Escravista. História da Festa de Coroação de Rei Congo, podemos destacar alguns elementos fundamentais de análise. O primeiro deles, apresentado por uma ampla bibliografia, mas aprofundado neste, é o fato de que a escravidão africana já existia antes da chegada dos europeus à África. O texto descreve com bastante minúcia como o tráfico de escravos do Atlântico pode ser caracterizado, de modo geral, como o desenvolvimento de uma nova rota de tráfico, como complementação das que já existiam dentro do continente africano. A autora destaca que a economia européia e das Américas - que dependia do comércio de escravos – teria alcançado tamanha amplitude sem que houvesse o impulso que as nações africanas deram ao vender grande quantidade de escravos para as caravanas.
Mello e Souza demonstra que os portugueses faziam acordos comerciais com povos africanos que, em certa medida, ganhavam destaque e prestígio frente aos vizinhos ao aceitarem alianças com europeus, tanto por poderem adquirir objetos que representavam poder como armas, ferramentas e novos conhecimentos, como pela aliança em batalhas entre povos e segurança. Esses acordos eram vantajosos para as duas partes, uma vez que os europeus poderiam comprar muitos escravos e catequizar os nativos; como ressalta autora, “como em todos os lugares de colonização portuguesa, a Cruz e a Coroa estiveram sempre juntas, defendendo os interesses da fé e do reino.”
Essas trocas e acordos, contudo, nem sempre foram pacíficas e imediatas, segundo a autora, a oscilação entre indecisões, mudanças de aliados e conflitos, foram comuns até meados do século XVII. O caso da rainha Njinga, destacado pela autora, auxilia na compreensão deste processo. Njinga era descendente de dois povos de formação da população de um reino na atual Angola, uniu os ambundos e os jagas. A rainha, quando jovem, se converteu ao catolicismo, mas assim que assumiu o poder, sob circunstâncias controversas, passou a oferecer séria rejeição aos portugueses, voltando-se à religião de seus antepassados e à cultura destes, motivo pelo qual, além de ser a primeira mulher rainha, neste contexto, Njinga se destacou, ganhando poder frente a outros povos locais. Um detalhe importante é que mesmo não mantendo aliança com o governo português, o tráfico de escravos permaneceu entre a rainha e o comércio existente com traficantes privados. Essa é outra característica comum e repetida entre os africanos neste período, como afirma Mello e Souza.
Devido à invasão dos holandeses ao nordeste do Brasil, estes também invadiram a costa de Angola, com a finalidade de obter acesso ao tráfico de escravos. Portugal nesta época, 1640, volta-se para a reconquista do território. Derrota a rainha Njinga, que após esta perda, passou a adotar o catolicismo novamente, chegando mesmo a pedir que missionários fossem a seu reino para a catequese. Contudo, Njinga entrou para a memória do povo daquela região como o símbolo da resistência ao poderio e influência estrangeira.
            A segunda parte do texto trata de forma mais direta os elementos fundamentais do escravismo africano. A autora destaca que entre os africanos a escravidão era algo cultural, presente entre as diversas tribos. As relações de poder não se davam pela posse de terras, mas pelas linhagens familiares que compunham o grupo. Assim, uma pessoa que se tornava escrava, mesmo que fosse da tribo, deixava de ser parte desta, mas era agregada à linhagem, aumentando o prestígio de seu senhor, que era proporcional ao número de escravos que possuía – característica semelhante, inclusive, com a escravidão brasileira – assim como o papel de propriedade para os europeus.
            As formas de se tornar escravo eram diversas. A guerra entre tribos era a principal, mas também poderia acontecer por dívidas, por venda de si ou dos filhos, ou mesmo pelo sequestro. Por mais que fossem diferentes as formas de se tornar escravo, uma vez feito, o indivíduo não mais pertenceria a sua comunidade tribal, a não ser como linhagem.
            A autora defende que o tráfico atlântico não foi o motor do interno continental, mas apenas uma nova rota. A demanda de escravos era distinta das outras rotas, sendo que mesmo com a intensificação da busca por cativos, as vendas eram feitas de diversas formas, atravessando diferentes compradores antes de chegar ao porto. O testemunho de um escravo alforriado nos Estados Unidos descreve e resume bem o processo. Feito cativo quando criança junto de sua irmã, preso por dois homens e uma mulher, enquanto os pais trabalhavam na lavoura, acabou passando por diferentes donos, a ponto de aprender três línguas distintas.
            Por fim, o texto trabalhado fornece um panorama geral do tráfico de escravos na África centro-ocidental, buscando definir as bases e principais características deste, de modo a salientar a relação empreendida entre os povos africanos e europeus – especialmente os portugueses.

9 comentários:

  1. Muito interessante o texto uma vez que quebra o nosso pensamento tradicional a respeito da escravidão de que os europeus (portugueses) foram responsáveis por perpetuar o modelo escravista de produção.
    Eu, particularmente, não tinha conhecimento de que a escravidão, antes de ocorrer no Brasil, já existia, e como diz o texto, era um elemento cultural entre os povos e tribos africanas.
    Toda a resenha nos faz pensar que não somente os portugueses tinham interesses na escravidão como os próprios africanos (superiores por relações familiares, guerras entre tribos), quebrando assim o mito de que os europeus foram os "vilões" da história.

    Érica Lippi - 3º RIN (4º História Matutino)

    ResponderExcluir
  2. É interessante observar as relações do texto de Marina de Mello e Souza com o de Robin Blackburn, “A construção do escravismo no Novo Mundo”. Há dois pontos em que fica evidente essa aproximação. No primeiro, ambos apontam que foram os particulares os responsáveis pelo comércio de escravos, sendo que chegam a tal conclusão partindo de análises de locais diferentes, Mello e Souza da África e Blackburn das Américas. O segundo ponto em comum levantado pelos autores, ocorre quando explicitam que o sucesso tanto da economia européia quanto das Américas dependia do comércio de escravos. Mello e Souza acrescenta ainda, a importância das nações africanas nesse cenário, por venderem grande quantidade de escravos para as caravanas.

    Carla Alexandra Passalha - 4° ano História noturno.

    ResponderExcluir
  3. Tal texto é fundamental na quebra de paradigmas que relacionam a escravidão de negros à colonização europeia na América, com ele provando a imensa complexidade existente nas relações sociais africanas, relações estas que também incluíam o aprisionamento e a utilização de membros de grupos rivais no próprio continente africano. Dessa maneira, é destacável que, quando desembarcaram na África, os europeus também se utilizaram de táticas já conhecidas pelos nativos para potencializar suas possibilidades em conseguir maiores números de mão-de-obra a suas colônias além-mar. Portanto, podemos assim concluir que houve em favor da escravidão uma série de acordos políticos entre europeus e africanos, acordos estes que desmistificam a escravidão como elemento quase que exclusivo dos colonizadores americanos.

    Lucas Ribeiro - 4º ano História diurno

    ResponderExcluir
  4. O texto salienta bem as questões relacionadas a existência de um comércio de escravo em diversas regiões africanas antes da chegada dos portugueses. Assim, muito por isso, é que foi possível desenvolver um tráfico negreiro do Atlântico, pois os colonizadores conseguiam obter uma grande quantidade de escravos sem muito "esforço", afinal aproveitavam das disputas politicas-territoriais das tribos africanas, sendo que se aliavam a uma e instigavam a guerra contra uma outra, algo que gerava escravos pela captura dos derrotados e, assim, estes eram negociados através de trocas com produtos trazidos pelos portugueses. Dessa maneira, torna-se claro que os portugueses não são os únicos responsáveis pela escravidão negra, tanto que esta já era existente na Africa,portanto os lusitanos apenas ampliaram o tráfico de escravos expandido-o até a América.

    Filipe Faulin Valentim 4º História diurno

    ResponderExcluir
  5. O texto da Maria de Mello e Souza, assim como o texto elaborado pelos discentes expõe muito bem a questão da existência da escravidão no continente africano antes da chegada dos portugueses. Pode-se acrescentar, entretanto, que a noção de propriedade privada da terra não fazia parte do universo cultural africano, e uma vez que o território era vasto e pouco produtivo em relação à densidade populacional, a posse de terras não era considerada símbolo de riqueza - ao contrário do que acontecia na Europa. Desse modo, a riqueza dos líderes dos clãs era reconhecida pelo número de escravos que possuíam, já que o sistema de linhagens - já explicado no texto acima - pressupunha a incorporação das gerações seguintes de escravos ao tronco da família do proprietário. A quantidade de escravos era ao mesmo tempo sinal de riqueza e de força.

    Marcos Felipe Godoy - Diurno

    ResponderExcluir
  6. Na verdade o ponto central do texto está nas relações de força e poder entre o africanos desse território centro-ocidental e os portugueses, além de outros povos europeus. É principalmente esse destaque que a autora quebra os antigos paradigmas de estudos do tema.
    O panorama geral do tráfico de escravos nesse território nada mais é do que uma tentativa de corroborar essas relações tal qual o Marcos Godoy ressaltou. Faltou essa relação.

    Carlos Manoel P. Vaz Jr. - 4HD

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Errata: "É principalmente COM esse destaque"

      Excluir
  7. O contato africano com os europeus, anterior ao grande fluxo de escravos para o Novo Mundo, foi motivado, principalmente, pelas trocas comercias entre tais povos. As relações comerciais estabelecidas na áfrica, afirmadas por Marina de Mello e Souza, gerou uma “educação” comercial nos africanos. Educação que, posteriormente, seria útil no Novo Mundo. Segundo Thorton, em “As transformações da cultura Africana no Mundo Atlântico”, escravos no Brasil que possuíam instrução comercial trazida da África eram de serventia na compra de novos escravos, pois, além do conhecimento de compra e venda, possuíam domínio tanto sobre a língua portuguesa quanto sobre os idiomas africanos. Tais escravos eram muito visados pelos comerciantes portugueses não apenas pelo fato de terem contato com a compra, mas por já conhecerem a lógica do comércio português que lhes fora apresentada ainda no continente africano.

    Carolina Defensor Ribeiro 4º H-diurno

    ResponderExcluir
  8. Esse texto sobre a escravidão na África demonstra que o escravismo não é uma exclusividade dos brancos. Já é sabido dos regimes escravistas em outras épocas, na Europa, mas quando falamos em escravidão, logo pensa-se em brancos europeus escravizando negros africanos. Marina de Mello e Souza ilustra bem o quadro da escravidão dentro do continente africano, mostrando ser um fator além de econômico, muito mais ligado à cultura, onde diferentes etnias disputavam por questões além do comércio e terras, como era nas guerras tribais.

    Lívia de Andrade Cañas - 4ºano História (Diurno)

    ResponderExcluir