domingo, 9 de outubro de 2011

O processo formativo da religião Afro-Brasileira.

Flávio Rodrigues Andrade
Maiara Mano
Rebeca Oliveira de Lima

Inicialmente os rituais religiosos no Brasil eram vistos como grupos étnicos que em comemorações festivas se dividiam de acordo com suas especificidades culturais como: linguagem, cantos, os instrumentos e a forma de tocá-los. Esses grupos inicialmente são chamados de nações étnicas e posteriormente nação de candomblé, resultado das mudanças religiosas que diferenciaram o conceito de nação étnica do de nação de candomblé.
À medida que a religiosidade vai ganhando mais importância, à religião passa a substituir a origem territorial e também as relações de parentesco dos africanos. A iniciação ao terreiro de candomblé passa a determinar sua nação, agora de caráter religioso, ambas se resumem ao nome do santo o qual o terreiro cultua.
A população africana foi transladada para o Brasil, trazendo para o Brasil “fragmentos de cultura”.
A formação de instituições afro-brasileiras se efetivou com as estruturas sociais complexas, que acomodavam as múltiplas culturas africanas.
Houve na América a reconstrução do “complexo fortuna-infortúnio”, como uma forma de resistência cultural e como uma necessidade para enfrentar os infortúnios e tempos difíceis (como exemplo a própria escravidão).
Passa se a ter um sincretismo afro-católico do Candomblé que encontra suas raízes nas duplicidades de práticas que surgiram no século XVII e se desenvolveu mais no século XVIII, um termo bastante usado para designar tais práticas, que são desde “ritos supersticiosos e gentílicos”, “pretos feiticeiros” especialistas nas “artes diabólicas” e etc., era o “calundu”.
Os calundus designavam também grupos com práticas rituais coletivas, em vez de realizarem apenas o processo de curador-cliente.
Confeccionavam altares e sacrificavam bodes vivos, santos de barros, pintavam seus corpos, benziam alimentos acreditando que trariam sorte, fortuna, etc. As práticas de altares realizados as escondidas são realizados pelos antecessores do candomblé do século XIX. Os rituais de cura e feitiçaria tem por objetivo a obtenção de amuletos, mandingas, já o sistema de altar-oferenda são "complexos materiais sacralizados!, de propriedade familiar coletiva, habitat de divindades.
No século XVIII os jejes eram o grupo demograficamente mais importante da Costa Africana na Bahia. Em oposição aos cultos congo-angola é que se organizaram cultos domésticos nas casas e roças, muitos alugavam casas onde realizavam esses rituais, uma forma de cooperação entre os africanos. Alguns calundus não utilizavam o tabaque para manter a descrição e evitar sua prisão.
Os jejes desenvolve no Brasil a tradição dos altares, que são complexos materias dedicados à divindades, onde no final do século XVIII se volta em torno de uma única divindade.
Havia também o problema da institucionalização da religião afro-brasileira que se deu por meio do progressivo nível de complexidade social e ritual, segundo o autor.
Mesmo diante da institucionalização dos cultos de práticas individuais as coletivas, ainda persistiram as congregações de porte menos e a perpetuação dessas práticas individualizadas.
Já no séc XVIII, funcionavam congregações extradomésticas, sendo esporádico e pouco estável, segundo a documentação.
Bastide defende a idéia de mudança nos cultos ao longo da chegada de novos africanos, ele acredita que somente no século XIX consolida-se uma rede social de congregações extradomésticas através de uma cooperação, desenvolve uma "comunidade religiosa afro-brasileira" e o surgimento do Candomblé.
Para o autor as práticas de cura e adivinhação é mais provavél que seja originária da África Central. O processo de reinstitucionalização das práticas religiosas africanas no Brasil passou por um processo de reconfiguração, ressignificação de elementos africanos de diversas origens.
A organização de tipo eclesial, que deu lugar ao Candomblé tem-se pensado na possível influência de irmandades católicas e maçônicas. Havia entre a África e o Brasil condições e dinâmicas sociais semelhantes.

 PARÉS, Luis Nicolau. Do Calundu ao Candomblé: o processo formativo da religião afro-brasileira. In: _______. A formação do Candomblé. História e ritual da nação Jeje na Bahia. Campinas: Unicamp, 2007, p. 101-123.

6 comentários:

  1. Interessante traçar aqui um paralelo com a colonização espanhola, no sentido em que nesta também observamos uma mescla religiosa. Conforme foi discutindo em aula, notamos que no contato entre africanos e europeus - no quesito religioso - ambos ganham e perdem elementos, já que o convívio cria condições para que os costumes religiosos de ambos os povos entrem em contato. No Peru, mais especificamente, os Incas, ao entrarem em contato com os colonizadores espanhóis, passam a ser catequizados e ensinados na doutrina cristã. Os jesuítas, dominicanos e franciscanos responsáveis por essa catequização utilizaram de diversas artimanhas para facilitarem esse aprendizado, sendo o meio artístico um deles (onde notamos o uso da pintura e escultura como meio de catequização). Entretanto, preocupados como estavam com a obtenção de resultados, esses evangelizadores acabaram por perder detalhes, o que abriu um espaço de resistência para os indígenas. Estes, entendendo a lógica do pensamento cristão, inseriram elementos de sua própria cultura dentro do cristianismo, criando uma religiosidade híbrida no país. Isso pode ser constatado no interior das igrejas peruanas, em pinturas e esculturas.
    Africanos e europeus, ao terem suas crenças colocadas lado a lado, se fizeram sujeitos ao mesmo tipo de situação, onde elementos foram absorvidos e reinterpretados. Dessa forma, por mais homogenea que seja a religião católica dentro da europa, não podemos afirmar a mesma coisa tanto no Brasil quanto no restante da América, como fica claro no texto de Parés.

    ResponderExcluir
  2. A meu ver, o ponto principal tratado pelo autor foi como se deu a institucionalização do Candomblé no Brasil. De acordo com Parés, num primeiro momento a religiosidade africana não era expressa de forma coletiva. Muito pelo contrário, os Calundus não tinham um espaço onde pudessem ser praticados. Os chamados calunduzeiros praticavam sua religiosidade pelas ruas, vagando e fazendo 'adivinhações e feitiçarias". A institucionalização se deu apenas no século XIX, quando já existia uma coesão e identificação entre os negros, que carregavam uma carga cultural diferente. Quanto a isso, na minha opinião, acredito que um fator que possa ter causado essa agregação foi o caráter 'fortuna-infortúnio' existentes nas próprias religiões africanas. Parés também compartilha dessa ideia ao afirmar que, por estarem todos numa situação de desgraça, os escravos se uniram em uma coletividade. O 'fortuna-infortúnio' foi de extrema importância para da formação da religiosidade afro-brasileira.

    ResponderExcluir
  3. É interessante ver a relação do negro com a religião católica e a sua identificação com certos conceitos católicos. Parés deixa claro como os negros encontraram nas práticas de origem africana, como o curandeirismo e os rituais funerários, os aspectos religiosos que mais se desenvolveram aqui: uma relação com a assistência aos enfermos e o enterro nas irmandades católicas. Também merece destaque a devoção aos santos do catolicismo, na relação indivíduo e intermediários espirituais que teriam a função de resolver problemas cotidianos, bastante semelhantes às relações entre os devotos e suas divindades africanas. Muitas práticas e hábitos católicos foram integrados às novas instituições afro-brasileiras. Tudo isso nos faz questionar até que ponto o sincretismo não se tornaria contraditório. Ao passo que Parés afirma ter sido necessário estrategicamente, para se lidar com as adversidades, em muitos momentos essa relação não foi estabelecida apenas como fachada: certas crenças católicas realmente correspondiam a religiosidade que os africanos instituíram.

    ResponderExcluir
  4. É certo que o principal prisma de analise nos casos apresentados foi o da re-apropriação das diversas figuras (em sentido amplo) religiosas, tanto aquelas trazidas na forma de memória quanto aquelas recém apreendidas. De tal modo, pode-se perceber um processo lento, que segundo o autor, pode ter durado um século e meio ou dois, de institucionalização das práticas religiosas assim estabelecidas: quer dizer, que da necessidade de sociabilidade através da congregação religiosa, bem como da distinção de outras práticas, vem a incindir sobre o regramento dos diversos grupos estabelecidos ou em processos de o ser, ou seja, a formação das diversas nações. Que a religiosidade católica esteja envolvida, seja de forma aparente para "legalizar" os cultos ou de forma sincrética, faz por merecer a ressalva de ser a religião inspiradora, de certa forma, da prática da congregação bem como a imagem por excelência de uma religião instituída, exemplo a ser mimetizado.

    ResponderExcluir
  5. É interessante a visão de Hugo Fragoso em seu texto "A Igreja na formação do Estado liberal" (História da Igreja no Brasil): os negros viam a Igreja Católica como "propriedade dos brancos", um instrumento dos brancos que legitimava a escravidão. Dessa forma, conforme os cânones católicos, um negro não poderia entrar para o sacerdócio. Mesmo assim, fazer parte de uma irmandade era um sinal de status a um escravo. Ser chamado de "irmão", ter seu lugar "oficial" nas procissões dos brancos, ter uma capela "sua" era distintivo e significativo para um negro, até mesmo porque ele poderia ocupar cargos como presidente, tesoureiro... Fragoso também afirma que a incorporação de aspectos da religião católica pelos africanos ou afro-brasileiros se deu porque suas religiosidades eram mais voltadas para o passado que para o futuro. A religião católica complementaria, assim, com a promessa de salvação da alma no futuro. Discordo da Joice em sua colocação de que a religião católica foi, ou é, uma religião homogênea na Europa. A questão dela ser diversificada aqui no Brasil não é fruto apenas da realidade brasileira. Se o catolicismo fosse homogêneo na Europa não teriam ocorrido as reformas protestantes, nem o Concílio Tridentino. Existiram e existem várias tendências dentro da Igreja Católica. Em Portugal,por exemplo, o Primeiro Ministro Pombal expulsou os jesuítas, que tinham uma posição sobre religião e política que não agradava aos que o circundavam. Pombal incentivou a formação de seminários que criassem um clero fiel ao Estado (e não ao Papa) e ligado às idéias liberais e não ultramontanas (conservadoras). Esse modelo de clero formado em Portugal foi também criado no Brasil. Foi justamente este clero, mais tolerante que o outro, que permitiu que certos aspectos das culturas afro se misturassem com os do catolicismo. Depois, vieram para o Brasil, membros da tendência ultramontana, inciando reformas. Portanto, a pluralidade católica brasileira foi fruto não apenas das religiões afro aqui existentes, mas também da própria pluralidade católica européia.

    ResponderExcluir
  6. Uma questão interessante no texto de Parés é refletir sobre como as crenças e ritos foram institucionalizados e também ganhando um corpo explicativo racionalizado no Candomblé da Bahia? É uma questão que perpassa todo o texto. Parés nos demonstra que o sucesso do Candomblé também está ligado à relação entre ganhar dinheiro e obter êxito na empreitada através do recurso às forças mágicas.Enfim, em situações cotidianas difíceis como era a vida dos escravos, libertos e também dos africanos livres, o recurso às crenças mágicas era uma garantia a mais para a alcance do fim desejado. Tal fenômeno relaciona-se ao tempo e ao dinheiro disponíveis principalmente dos libertos que ganhavam a vida em atividades comerciais. Os Candomblés serviam como quilombos e as casas de zungu, na Corte, como lugares de pouso para escravos fugidos dos seus senhores, que, pela natureza das atividades características de sua condição social, não podiam manter uma relação ritual constante com o Candomblé.

    ResponderExcluir